terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

Desfazer

                            Resultado de imagem para bomboniere de vidro vermelha


Demorei, mas hoje desembestei a escrever.
Estava folheando livros, vendo fotografias e lembrando...
É bom escrever, adoro ler e escrever. 
Escrever é libertador, é aliviante, é bom.
Cristaleira, bomboniere...
Tempos difíceis, seca inclemente, fome...
A casa era bonita, simples, mas arrumadinha. Lembro da sala, com a cristaleira de madeira escura e vidros desenhados com motivos oníricos. A grande mesa de madeira robusta complementava o conjunto e o toque final ficava por conta da bomboniere de vidro vermelho sobre a toalha delicadamente bordada por minha tia Antonia; mamãe adorava a cor vermelha.
Às vezes minha avó Mãevelha colocava ali o doce de mamão ou abóbora, ficava mais bonito para oferecer às visitas. 
Mamãe era professora e sempre recebíamos em casa a visita de outros professores e dos temidos "coronéis".
Mas a Seca veio forte e ainda mais cruel dessa vez e mamãe precisou vender o que tinha de valor para que pudéssemos sobreviver.
A cristaleira, a mesa robusta, as cadeiras e, por último, a bomboniere de vidro vermelho.
Lembro da expressão no rosto de mamãe, da tristeza em ter que se desfazer das coisas que tanto gostava e que conseguira comprar com tanto custo.
Mas a fome já batia à nossa porta e se desfazer era preciso.
Nos desfazíamos aos poucos de nossas coisas e de nós mesmos, um pouco acada dia.
É isso.



                                  




                                      

Filhas

                               Resultado de imagem para pais e filhas



Estava olhando fotografias da família e reparei na beleza das minhas sobrinhas, todas muito fashion e vaidosas.
Até mesmo a caçulinha Rafaela é muito vaidosa, adora se arrumar e faz pose para fotos.
Estão sempre com roupas "combinantes", cabelos arrumados e um batom nos lábios, no caso das mais velhas. Entendem de moda e procuram seguir as tendências, dentro do limite financeiro da família.
Não pude evitar, e as comparei comigo, com minha infância, com o modo como fui criada, vista, julgada e tratada.
Roupa nova era comprada uma vez por ano, próximo ao Natal com o décimo terceiro salário, e só podia ser usada em ocasiões especiais. Se papai nos encontrasse vestidos em nossas roupas novas em dias comuns, pronto,o sermão começava.
Muitas vezes as roupas ficavam curtas, apertadas ou "perdidas", pois crescíamos rápido, e mamãe levava à costureira para ajustar ou ajustava em casa mesmo, do jeito dela. Eu mesma já sabia pregar botões, alinhavar, fazer barra de calça desde meus oito, nove anos.
Não éramos incentivadas, eu e minha irmã do meio, a nos arrumar e nunca recebíamos elogios, sempre críticas e gozações, tanto de nossos irmãos e nosso pai. Deixamos a vaidade de lado e ela também nos deixou.
Não usamos maquiagem, anéis, pulseiras e outros adornos, pois sempre pensamos que alguém vai nos olhar de modo estranho. É estranho e até bobo, mas é verdade.
Minha irmã do meio teve a sorte de nascer bonita e ter o cabelo "bom", mas eu não tive a mesma sorte. 
Engraçado como esses traumas e inseguranças da infância ficam marcados na gente como a marca do ferro quente na pele do gado.
Mas gosto de ver minhas sobrinhas sempre lindas, arrumadas e incentivadas pelos pais. Sem críticas, sem cobranças, sem julgamento. Quase todas elas.
Os pais podem criar pessoas seguras ou inseguras, depende do modo como se relacionam com seus filhos.
É isso.



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Ilha Comprida e Iguape

                                Resultado de imagem para ilha comprida e iguape



Passei o Carnaval na casa do meu irmão caçula, em Ilha Comprida, adorei.
Precisava sair da "toca", respirar novos ares, ver outras pessoas e paisagens; vi e gostei.
Estava preocupadíssima com meus gatos, pois não gosto de ficar muito tempo longe de casa e deles, principalmente. Tinha algumas pessoas que poderiam cuidar da casa e dos gatos, mas eu queria alguém que realmente gosta de animais e que os trata bem. Deixar alguém só porque é de confiança não era o suficiente para mim.
Desconfio de pessoas que não gostam de animais e plantas, as considero frias e insensíveis, por mais boazinhas, honestas, direitas e corretas que sejam ou pareçam ser.
Lembrei da menina do vizinho, que é gateira apaixonada como eu e trata os animais com amor e respeito, mesmo não sendo muito fã do seu cachorro bobão e guloso que adora comer a ração dos meus gatos.
Falei com ela, entreguei-lhe as chaves, dei-lhe um agrado, tudo certo. Posso viajar e vou tranquila, graças a Deus.
Seguimos pela Rodovia Régis Bittencourt, que liga aos estados do Sul, e fizemos uma viagem tranquila, apesar das intermináveis obras de duplicação da estrada. Cansativo, mas a paisagem é linda. Pena que estejam devastando para botar mais cimento e asfalto; penso nos pobres animais que ali viviam.
Antes de chegar à Ilha Comprida passamos por uma estrada charmosa com muitas barracas de produtos à venda: jaca, abóbora, palmito, doces... Passamos por Iguape, uma charmosa cidade com prédios históricos abandonados, uma pena. Depois de Iguape, subimos a ponte que liga a ilha ao continente e estamos em Ilha Comprida.
Sol forte e pele branca não combinam, mas estava tão bom naquele rio de águas frias e escuras que vai de encontro ao mar de águas claras e mornas. Lindo.
Sentei-me no rio, abracei as águas e agradeci por estar ali. Queria entrar no mar, mas as águas são mais bravias e eu estava na cadeira de rodas. Mas o mar queria me ver tanto quanto eu queria vê-lo e ele veio ao meu encontro. Lindo.
As águas do mar invadiram o rio com força e aquela violência bela que me encanta; abracei o mar e agradeci pelo encontro.
Sou Maria das Águas, amo e respeito as coisas da Mãe Natureza.
Ficamos muito tempo brincando com as águas e voltamos para casa vermelhos e cansados. Valeu a longa viagem, os pés inchados e a saudade dos gatos.
Há tempos queria muito ver o mar e finalmente vi. Mar e rio, lindos, fortes e poderosos. Agradeci àqueles que ali habitam e dali nutrem suas forças. 
Passeamos por Iguape e pela ilha nos dias seguintes e depois voltamos para casa. Tudo em paz.
Uma leve tristeza e solidão habitavam a casa e me causaram dor e desespero. Vai passar. Passou, graças a Deus.
Pretendo voltar à Ilha Comprida e explorar os encantos da ilha e da cidade vizinha, Iguape.
Sem barulho, sem música alta na madrugada e ouve-se a música do mar ao amanhecer. Pertenço às águas. Pertenço ao mar.
Quero um dia voltar àquelas águas andando com minhas próprias pernas. Vou conseguir.
É isso.



                             

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

Muito calor.

                               Resultado de imagem para odeio calor



Calorão de trinta e dois graus, mas a sensação térmica é de quarenta.
Detesto calor, me deixa molenga, cansada, desanimada...
Os gatos bem alimentados e peludos deitam no chão ou em qualquer lugar mais fresquinho.
Estou ficando cada vez mais dolorida e entrevada, sinto isso, e os remédios que funcionavam tão bem, agora parecem simples placebos.
Hoje vieram o entregador da farmácia e da ração e precisei jogar a chave para eles; não conseguia descer o degrau que tem na entrada da casa.
Os gatos já conhecem o carro e o entregador de ração e associam qualquer carro ou pessoa que me esperam no portão como portador de algo  gostoso.
Eles se acostumaram assim; eu saía e em algumas horas voltava para casa com sacolas de alimentos para mim e para eles. 
Sinto muita falta dessa liberdade de ir e vir, de bater os quatros cantos do mundo, como dizia mamãe, e ainda ter energia para fazer as coisas pela casa.
Eu tinha saúde.
É isso.



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