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quinta-feira, 3 de maio de 2012

Irmãzinha

E a treta com os moleques da ponte continua...
Era um domingo e fomos ao mercadinho do bairro para comprar algumas coisas para o almoço. Deveríamos também comprar um maço de cigarro para papai.
Fomos eu, Rogério, Naldão e Rosi; Fubá era bebê ainda.
Caminhávamos pelas ruas de terra vermelha cercadas pelo verde das chácaras. Um passeio bucólico.
Tudo ia muito bem até que vimos um grupo vindo em nossa direção. Não demos muita importância, achamos que era apenas pessoas comuns andando pelas ruas.
O grupo se aproxima e reconhecemos: os moleques da ponte! Ferrou!
Os moleques da ponte também tinham uma irmãzinha e ela andava inocentemente com eles naquele lindo e bucólico dia de domingo.
O moleque maior provoca: "Você bateu no meu irmão, agora eu vou bater no seu!".
"Mas ninguém fez nada! Ninguém quer confusão aqui!"
"É, mas nóis qué descontar, então vamos bater naquela pequenininha ali"
"Na minha irmãzinha?! E o que foi que ela fez?! Se você quiser briga, chega junto, agora bater na minha irmã pequena, de jeito nenhum!".
"Ah é?!
"É!"
E o pau comeu de novo. Os dois grupos assistindo à briga entre mim e o moleque grandão da ponte. 
Rosi ficou assustada e se escondeu atrás de Naldão e Rogério correu pra casa pra chamar algum adulto. Veio um primo nosso que apartou a briga e aconselhou que vivêssemos em paz.
Tá.
Mas desde que não mexa com meus e minhas doces e inocentes irmãos e irmãs.
Beleza?

                                         

sábado, 28 de abril de 2012

Pombos de Gesso

Todos os domingos Paipreto e Mãevelha vinham nos visitar na Fazenda Taquari, onde eu e meus irmãos nascemos.
Quando não podiam nos visitar, mandavam nosso primo João vir me buscar a cavalo.
Mamãe tinha uns pombinhos de gesso na parede do seu quarto e eu sempre cobicei aquelas interessantes figuras; queria pegá-las, tocá-las e depois quebrá-las.
Fiz isso uma vez com mamãe, que me deu um dos pombinhos achando que eu só queria brincar, mas eu quebrei e levei umas boas palmadas.
Paipreto chega para a visita e me encontra chorando; pergunta o que aconteceu e mamãe conta o ocorrido.
Paipreto me pega no colo, me leva até o quarto de mamãe, aponta para os pombinhos de gesso e me pergunta qual deles eu quero.
Quero todos!
Paipreto me dá os pombinhos e eu deixo cair alguns, quebrando-os. Mamãe não gostou nada dessa brincadeira e reclama dizendo a Paipreto que ele lhe tirava a autoridade de mãe.
"Mas bater na minha neta por causa dessas porcarias? Não senhora! Vou até a feira e lhe compro mais desses pombos bestas de gesso. Oxe!"
Saudades dos braços protetores de Paipreto.




                                             

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Bala de Mel

                                              


Estávamos a pouco tempo em São Paulo e tínhamos nos mudado para o bairro onde moramos até hoje. Quando aqui chegamos, moramos por um mês num bairro da Penha, na casa do tio Manoel Gomes e nosso primo Pedro "Sabe como é o negócio" conseguira alugar um pequeno barraquinho próximo à sua casa.
O primo sempre falava a frase "Sabe como é o negócio" e a usava para tudo o que fosse assunto. Ele não é muito normal, é meio fraco das ideias.
Uma prima nossa, a Ivete, que ri de tudo e por tudo, já morava no bairro há algum tempo e pede ao seu marido, o finado Antonio Roque, para nos mostrar os arredores.
Mamãe e Mãevelha cuidam da limpeza do pequeno barraco enquanto papai, o tio Manoel Soares e o primo Pedro cuidam da mudança. Não tinha muito o que trazer; basicamente sacolas e malas com roupas e alguns pertences. A esposa do tio Manoel Gomes nos deu um sofá cama grandão e pesadão de plástico vermelho com minúsculas bolinhas coloridas. Aquilo me lembrava o Universo, as estrelas e as constelações. É, eu sei, eu tinha apenas seis anos, mas também sempre fui meio fraca das ideias. Mal de família.
É que tínhamos outro primo maluquetes mas de inteligência absurda e ele gostava de ir à casa de Paipreto e Mãevelha para estudar e ler seus muitos e adorados livros. Ele gostava da ampla mesa da casa de meus avós e dizia que estudava melhor naquela mesa grande e limpa. Eu também sou assim, nunca consegui estudar e/ou fazer minhas lições de casa se a mesa não estivesse limpa e arrumada. Mania de gente maluquetes.
O primo intelectual, João Cândido, nunca se casou, não teve filhos e preferia a companhia de seus preciosos livros à companhia de pessoas; de certas pessoas, talvez.
Estou achando que isso é mal de família mesmo. Ai Jesus!
João Cândido respondia às perguntas de Paipreto e falava sobre tudo: geografia, História, línguas, astronomia e para toda pergunta o primo tinha uma responda inteligente na ponta da língua.
Eu ouvia as conversas do primo João Cândido com Paipreto e acredito que foi dai também que surgiu meu interesse pelos livros e pelo conhecimento.
Aliás, meu Paipreto sempre dizia: "Minha filha, não tem riqueza maior no mundo do que o conhecimento".
Meu Paipreto.
Bom...
Durante a limpeza do barraco e a mudança dos nossos cacarecos, papai pede a Antonio Roque para ir comprar café e cigarros; não conhecia bem a região e estava ocupado com seus afazeres.
Vou com Antonio Roque ao botequinho e caminho segurando sua mão.
Antonio Roque era negro e alto e eu achava que ele parente do meu bisavô Francisco. 
E eu tenho uma coisa com mãos; adoro pegar, segurar, beijar, buscar força e conforto nas mãos daqueles que gosto. As compridas e fortes mãos de Rafaela, as brancas, finas e delicadas mãos de Maitê, as mãos hábeis ao segurar o lápis de Beatriz, as mãos sempre magrinhas, frágeis e compridas de Maria Julia, as mãos fofinhas e gordinhas de mamãe... Mãos.
Volto para casa com Antonio Roque e ele me mostra o bairro que consiste basicamente de chácaras, ruas de terra e de barro vermelho agora alagadas pelas fortes chuvas de março. São as águas de março fechando o verão é promessa de vida em teu coração - Tom Jobim e Elis Regina. Grandes talentos de nossa música.
Observo o verde das chácaras contrastando com o céu límpido e azul, as nuvens brancas e fofas, a terra vermelha molhada e a correnteza que se formara com as fortes chuvas.
Achei lindo aquele espetáculo da Natureza; aquela profusão de cores e sentidos.
Cheiro de terra molhada, cheiro das verduras frescas e molhadas das chácaras, cheiro do café e do cigarro de papai.
Antonio Roque havia comprado também algumas balas de mel. Para nós, bala era só de revólver e a bala doce era chamada de confeito. 
Lembro-me da embalagem das balas de mel, era um papel amarelo com listras pretas imitando o corpo de uma abelha. Lembro da marca da bala: Kid´s.
A bala era dura e recheada com um líquido que deveria ser mel. Era muito claro e ralo para ser mel, mas tinha gosto de mel. Pronto.
Caminhamos de volta para casa e paro aqui e ali para apreciar as belezas e encantos da Natureza. Antonio Roque espera pacientemente e diz para irmos logo, pois vai escurecer e papai e mamãe já devem estar preocupados com a demora. Não havia iluminação na nossa casa nem na rua, só nas ruas e avenidas principais do bairro. Nosso barraco era iluminado à luz de velas, mas pouco tempo depois foram feitas melhorias no bairro e já podíamos assistir ao Jornal Nacional numa grande, velha e pesada TV dada por tio Manoel Gomes. 
Chegamos finalmente em casa e mamãe pergunta: "E por onde vocês andaram?"
Antonio Roque conta o ocorrido e mamãe diz: "Mas essa minha moleca não jeito mesmo"