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sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

Invisível.

                                  


Li um fabuloso texto de Nara Rúbia Ribeiro Tela de Célia Anahin: "Inexistência" e nele a autora fala que quando era criança brincava de não existir.
Transcreverei o texto em postagem a seguir.
Uma certa manhã minha professora de Psicologia da Educação sugeriu que ficássemos "invisíveis" e que detalhássemos como seria a experiência, como nos sentiríamos e como faríamos para nos tornar invisíveis. Claro que metafisicamente/metaforicamente.
Mas teve alunos que não entenderam bem a essência do exercício proposto e disseram que se vestiriam de super heróis, usariam máscaras, maquiagem etc... 
Não, não é assim que se fica invisível.
Em meu texto entregue à professora eu escrevi que apenas andaria pelas ruas, ou por onde quer que eu fosse e/ou estivesse, como se não houvesse mais ninguém no mundo, como se eu fosse só no mundo.
Eu sempre soube ser e ficar invisível em meio àquele povo todo que morava em minha casa. Eu sempre me senti invisível, insignificante; eu era apenas mais uma boca a ser alimentada, mais dois pés a serem calçados, mais um corpo de criança que crescia muito rapidamente e logo "perdia" as roupas que tinham sido compradas com tanta dificuldade e que deveriam durar quase que para sempre.
Senhores pais, os filhos crescem!
Em meio a tanta gente, tanto parente, tantos conhecidos e tantos irmãos, eu era apenas mais uma.
Eu me desdobrava para ser vista, percebida, querida, mas eu era apenas mais uma.
Eu me esforçava para fazer as coisas direitinho, para agradar, para receber um elogio, mas só vinham críticas, comparações e reclamações.
Lembro de uma novela, daqueles novelões longos, dramáticos, chorosos e com mocinha e mocinho vivendo e sofrendo por amores impossíveis. Lembro que o ator principal era o então galã Claudio Cavalcanti e a personagem dele sofria, e muito, com seus sentimentos por uma moça que tinha problemas psicossociais (mentais, para a época).
Essa moça, a personagem, se "desligava" do mundo real e se perguntava o tempo todo: "Quem sou eu? Eu existo? Aonde estou?".
Eu fica intrigada com aquilo e tentava fazer o mesmo, quando raramente estava sozinha. Prepara a mamadeira da minha irmã Rosi e dizia para minha avó que iria colocar o bebê para dormir e aproveitava para ler escondido ou fazer minhas viagens fora de mim.
Eu olhava para um ponto fixo e imitava a personagem da novela: "Quem sou eu? Eu existo mesmo?"
A sensação era estranha. Sentia como se estivesse em meio ao nada e um vazio imenso me invadia e me transportava para imensidões infinitas, para um outro Universo frio e vazio. Eu precisava ser rápida, tinha que voltar logo, tinha medo de não conseguir voltar a tempo e de repente, minha avó ou alguém entrar por aquela porta e me pegar "viajando".
Seriam capazes de chamar padres e benzedeiras para benzer a mim e à casa.Me mandariam para a igreja, me confessar e participar de todas as missas possíveis. Iriam me chamar de doida. Iriam me proibir de ler. Tomariam meus livros de mim.
Decidi fingir normalidade e fingir aceitar aquela rotina de trabalhos e obrigações, como se tudo aquilo fosse obrigação minha. Se eu reclamasse, seria taxada de "moleca preguiçosa e sem vergonha que só quer viver agarrada com livro".
Segui na minha invisibilidade humana e infantil.
Segui na minha forçada maturidade humana e adulta.
Às vezes sinto-me invisível.


                                          


















quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Fronha

                                        

Zapeava pela TV, como sempre faço, e decidi parar em uma canal religioso.
Aliás, canais ditos religiosos e canais de vendas são o que mais têm e o que poucos veem, mas temos que pagar por eles, mesmo que não os assistamos.
Falei sobre isso com a atendente da Net e reclamei sobre o fato de pagarmos por algo que não assistimos; não poderíamos mudar? Trocar por outros canais de filmes, por exemplo?
A simpática mocinha disse que não, não pode mudar nada! Que o pacote já é definido e o temos empurrado goela abaixo. Paciência.
Mas quem é o mané que define o pacote? Por acaso ele nos perguntou se queremos assistir a exploração da fé em inúmeros e seguidos canais? Ofertas disso e daquilo?
Isso é uma ditadura, penso eu.
Mas eu zapeava pelos canais, como disse, e me chamou a atenção o relato de pessoas que se diziam curadas de doenças ósseas, tumores, cegueira e até de aleijados que voltaram a andar. Puxa vida!
Como todo o respeito.
Tenho respeito e dó por essas pessoas simples e desesperadas que procuram ajuda para resolver seus problemas.
Tenho asco por essas pessoas que se dizem mensageiras de Deus na Terra e que exploram a fé, a inocência e a ignorância dos desesperados.
E isso não é de hoje.
São garrafinhas de água vinda de Israel, a Terra Santa.
São garrafinhas com óleo ungido também vindas da Terra Santa.
São livros, CD´s, DVD´s e boletos bancários para engordar a obesa conta daqueles que professam uma falsa fé e enchem seus bolsos com suado e honesto dinheiro dos necessitados.
Procuro respeitar a tudo e a todos, como sempre digo, mas há situações que causam revolta, como por exemplo o fato de crianças não poderem comemorar seus aniversários e terem um festinha simples e convidar seus amiguinhos. Por quê?
Festas juninas também são proibidas. Por quê?
Querem transformar as pessoas em zumbis acerebrados?
Já estão.
Querem curar gays?! Desde quando opção sexual é doença?!
Bom, além de toda a parafernália pseudo religiosa que vendem, o que me intrigou foi a oferta de uma fronha milagrosa e que custa o módico preço de noventa e um reais.
Noventa e um reais por uma fronha?!
Costumo pagar entre cinco e sete reais por fronhas bonitas e boa qualidade nas lojas Pernambucanas! 
Bom, as fronhas que compro apenas protegem o travesseiro, não fazem milagres.
Liguei para o número colocado na tela para que as pessoas liguem e adquiram a fronha e façam doações para a obra do Senhor, não sabia que Deus era pedreiro. Arquiteto, talvez?
São várias contas abertas em vários bancos para facilitar a vida do fiel que vai depositar seu rico dinheirinho. 
Deus é fiel.
Fiel? Deus é corinthiano?
Certa vez alguém disse que eu lia demais e que os livros eram inimigos e que a pessoa só deveria ler a bíblia. Não sei por que, mas isso me lembrou os livros proibidos de Fahrenheit 451.
Outro disse que blogueiros são filhos do demo... Não sabia que eu era adotada.
Desde que o mundo é mundo os mais espertos manipulam os mais inocentes. Manipulam, exploram, proíbem, ditam regras, costumes, ideologias...
Cada cabeça uma sentença, já dizia mamãe, mas me incomoda o fato de proibir coisas tão simples e que dão tanta alegria às crianças.
Me incomoda explorar, vender saúde, vender a cura.
Se fosse assim, hospitais, médicos e planos de saúde iriam à falência e deixariam de existir.
Não sei se deveria escrever e publicar essa postagem, mas vejo absurdos demais e que têm me incomodado e preocupado.
Não pretendo ofender a ninguém e muito menos à fé alheia, mas o Deus em que acredito não precisa de dinheiro.
Não encontro Deus em templos de ouro e mármore. Não encontro Deus em proibições absurdas. Não encontro Deus em promessas mirabolantes.
Deus está dentro de cada um, somos sua igreja.
Igreja não é um edifício, um prédio ou um templo; igreja é cada um de nós.
Palavras mal interpretadas, deturpadas, manipuladas.
Deus me livre de todo mal. Amém.


                                              
                                       

quinta-feira, 26 de abril de 2012

Igreja Matriz de Gravatá

Igreja Matriz de Gravatá - Pernambuco
                                            
Estava na Igreja Matriz de Gravatá com Mãevelha e Paipreto.
Papai e mamãe estavam fazendo a feira.
Mãevelha assiste à missa com seu véu a cobrir-lhe os cabelos e o rosário em suas mãos branquinhas e enrugadas. Meu Paipreto segura seu chapéu coco junto ao peito.
Rezam, cantam louvores, ouvem o sermão do padre, comungam... A missa continua.
Estou inquieta, olho tudo à volta, observo as pessoas compenetradas, a fé em suas feições.
Mãevelha faz sinal para eu ficar quieta e Paipreto diz que se eu não ficar quietinha, Papai do Céu não vai gostar, vai ficar triste.
Forma-se a fila para receber a hóstia e eu caminho pelo corredor da Igreja segurando nas mãos dos meus avós. Caminhamos lentamente ao encontro do padre que colocará a hóstia na boca dos fiéis. Eu também quero. "Pode não".
Enquanto caminho observo as imagens dos santos, as pinturas, os vitrais.
Olho para trás e vejo um homem de estatura mediana vestido em trajes bem parecidos aos dos santos. Eram tecidos de cores em tons crus e vermelhos. O homem sorria.
Puxo a mão da minha avó e digo: "Mãevelha, aquele homem ali é igual ao santo, a senhora viu?". "Se aquiete, tu vai atrapalhar a missa do padre e o povo da igreja não gosta de menina enxerida não".
Voltamos a nos sentar e a missa estava próxima do fim. 
Mexo e remexo, olho para trás, para os lados e o homem vestido com aqueles panos sorri para mim de novo.
A missa termina e nos preparamos para ir embora. Puxo Mãevelha pela mão e a arrasto até a imagem do homem que havia sorrido para mim e digo: "Olha, Mãevelha, era esse homem que estava sorrindo pra mim".
"Oxe, deixe disso, essa menina. Isso é pecado. Não pode desrespeitar a imagem de Nosso Senhor Jesus Cristo".
Mas eu juro por Deus que Ele sorriu pra mim!


                                         

terça-feira, 21 de fevereiro de 2012

Igreja Santa Rita de Cássia e os pães

                                            


Quando chegamos a São Paulo moramos por um mês na casa do tio Manoel Gomes, irmão de mamãe, e depois nos mudamos para nosso bairro.
Éramos vizinhos da Igreja Santa Rita, que na época estava em construção ou reforma; não sei dizer exatamente. 
Sei dizer que brinquei muito debaixo da igreja e sobre os montes de areia da construção.
Lembro que o piso da igreja ficava a mais ou menos meio metro do chão e as pessoas passavam por uma rampa para poderem entrar no recinto.
Hoje está tudo nivelado com a rua, mas naquela época o bairro sofria com as enchentes e a igreja está sobre um terreno que outrora fora charco e área de muitas chácaras, por isso a altura entre o chão e o piso da igreja.
Mãevelha e eu íamos sempre às missas e ela gostava de levar suas flores para o altar. 
Íamos sempre à missas dominicais, mas na época da Páscoa íamos a todas as missas que tivessem durante o dia. O motivo era a distribuição de pães.
Havia cestos de vime cheios de pães e o padre os abençoava e no fim da missa os distribuía às pessoas presentes.
Morávamos num barraco simples e muitas vezes esperávamos mamãe voltar do trabalho para sabermos o que iríamos jantar. Mamãe sempre dava um jeito; pedia emprestado a um vizinho ou a algum parente que morasse próximo.
Voltávamos com os pães para casa e papai ainda brincava: "E vocês vão pra missa de novo é? Vão ver o padre ou vão buscar pão?"
Mãevelha, sempre muito séria e religiosa, não gostava dos comentários engraçadinhos de papai e o recriminava: "O Dedé, tu deixe de graça, visse? E tu bem que come do pão, num é? Me arrespeite, homi".
E os pães da Igreja Santa Rita aliviaram nossa fome muitas vezes, graças a Deus.


                                           





sábado, 5 de novembro de 2011

Canteiros

Cravina


Ouvia Fagner cantar maravilhosamente a belíssima versão que ele fez do poema "Marcha" de Cecilia Meireles.
Identifico-me com a letra da música.
Ouvia "Canteiros"  e fui cuidar do meu pequeno canteiro, que aos poucos vou ampliando. Contando, claro, com a colaboração nem tanto colaborativa de meus gatos, principalmente de Aurora, a Terrível.
Fui surpreendida pela bela presença de uma flor fúcsia, ou rosa forte, ou pink, ou cor de bunina, como dizia mamãe. Segundo fui informada, essa plantinha de belas flores rosa choque recebe o nome de flor de maio. Mas estamos em novembro!
Deve ser o aquecimento global, penso eu.
Chamou-me a atenção as pequeninas e delicadas flores coloridas da planta que mamãe e Mãevelha chamavam de bunina. Eu só conhecia de uma cor, mas pude ter o prazer de ver que há cores e tons variadíssimos e belíssimos.
Herdei de mamãe e de minha avó o gosto, o cuidado e até o ciúme pelas plantas.
Mãevelha tinha cuidado especial para com suas cravinas (pequenos cravos). Ela as cultivava em delicados tons de rosa bebê ou rosa clarinho. Colhia suas flores favoritas e as levava para a Igreja Santa Rita de Cássia. Lá chegando, depositava suas cravinas queridas e tão bem cuidadas aos pés das santas. Nossa Senhora, Santa Rita de Cássia e se sobrasse algumas flores, colocava uma para cada santo da ala masculina.
Acho que Mãevelha era feminista.
Tia Anália também gostava de plantas e tinha o mesmo ciúme genético que está contido no DNA da família. 
Quem realmente gosta de algo, alguém ou alguma coisa, cuida de verdade. Valoriza. Respeita. Se preocupa. Sabe que as coisas boas dependem de nosso cultivo. E falo isso não apenas no sentido florido. Literalmente.
Tia Anália tinha um pequeno quintal cheio de plantas e algumas cobiçadas por mim. Tinha um pé de pitanga, espada de São Jorge, uma pequena horta com coentro, cebolinha verde, salsinha e um lindo pé de cróton. Mas nós falávamos "cróti".
Um dia fomos à casa da tia e a encontrei regando suas preciosas plantas. Pedi a ela uma muda do cróton, mas ela disse que não poderia arrancar a mudinha porque iria prejudicar toda a planta; eu teria que esperar pela chuva. Acreditamos que as plantas devem ser podadas e transplantadas na época de chuva, pois o choque será menos intenso para planta.
Como pode-se ver, também nos preocupamos com o bem estar psicológico das plantas.
A desculpa de tia Anália não me convenceu. Esperei o momento certo e quando ela estava na cozinha preparando o café, aproveitei e arranquei uma mudinha do cróton. Ao lado da casa havia um terreno baldio; deixei a mudinha lá para levá-la quando fossemos embora e para não levantar suspeitas.
O tempo passou, as chuvas foram e voltaram a seu tempo e um domingo tia Anália vai nos visitar. Ela caminha pelo longo quintal de terra e para a cada planta para admirá-la e fazer comentários. Lá está o belo pé de cróton; forte, bonito e colorido. Sempre gostei da mistura de tons fortes e intensos de vermelho, verde e branco.
Tia Anália elogia a planta: "Mas que pé de cróti tão bonito". 
Eu falo a verdade e a tia balança a cabeça: "Mas tu não tem juízo mesmo!".
"É que planta roubada pega mais fácil e fica mais bonita do que a planta dada". 


Bunina




quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Sermões de papai. Mais "inguinórança"







Mais pérolas, ou melhor, mais "inguinóranças" de José Soares Neto, o Dedé; meu pai.
Papai levantava-se cedo todos os dias; mesmo nos fins de semana e feriados. É um hábito do nordestino levantar-se bem cedo.
Papai ia para a sala e ligava a TV para assistir a missa das seis horas da manhã! Nós pedíamos para mamãe pedir para ele abaixar o volume; estava muito alto e nós queríamos aproveitar mais umas horinhas de sono tranquilo antes de começar a sessão sermão. Infalível!
Pronto. Bastou mamãe fazer nosso pedido e papai iniciou o falatório. Jesus!
"...Que voceizi devia ir assistir uma missa". E o senhor vai? Perguntávamos nós cheios de coragem com o apoio de mamãe.
"...Voceizi não vão a igreja pra ver o padre". Ver o padre pra quê? E o senhor também não vai à igreja e quer que a gente vá?!!! Vixe! Papai ficou doido!
"Eu não careço de ir a igreja, eu não tenho pecado! Eu não tenho defeito". Claro, o senhor é o homem de Deus.
"Sou o homem de Deus sim! Meu único defeito é ser pobre. E é mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha do que o rico entrar para o Reino do Céu".
Mas quem falou de rico e de camelo aqui?
"Voceizi são tudo inguinórante! Vão pra escola todo dia e não sabem de nada!"
Olhávamos para cima como que pedindo um milagre quase impossível: papai parar de falar.
Papai detestava quando fazíamos isso; dizia que ficava com o "má dos cachorro" quando a gente "revirava os zóio pra cima".
Dali a pouco ouvíamos alguém chamar do portão. Graças a Deus! Uma pausa no sermão.
Eram os amiguinhos de Fubá, meu irmão, que vieram chamá-lo para brincar na rua e aprontar muitas das suas artes.
Um tempo depois Fubá voltava da rua e acendia a luz da sala para mostrar um pipa que havia pego. Pra quê? Lá vinha sermão de novo.
"Pra quê essa luizi acesa meio dia em ponto!". Mas não é meio dia em ponto, são só 9 horas! Mais sermão.
Hora do almoço. Arroz, feijão, a sempre presente farinha de mandioca, salada de alface e tomate e de mistura ovo frito ou cozido.
Papai não gostava da mistura do dia. Dizia que nasceu comendo carne; que não era cavalo pra comer bredo (alface); que Deus disse que nem só de pão vive o homem, carece de comer uma carninha também. 
Mas pai, quer dizer que não é só de comida que vivemos; precisamos alimentar a alma também. E o senhor tomou leite da sua mãe quando nasceu. Ninguém come carne quando nasce. Oxe!
"Oxe menino! E derna de quando morto come? Deus disse que nem só de pão vive o homi é pruquê a gente tem que cumê carne também!".
Mamãe dizia que era o que tinha e que devíamos dar graças a Deus, pois tem muita gente passando fome pelo mundo.
Mas papai não aceitava: "Eu trabalho que nem um fio duma égua pra não ter um pedaço de carne pra cumê?! Deus disse que ...".
Tá bom pai, pelo amor de Deus! 
Mas o sermão continuava: sobre comida, carne, camelo, agulha, rico, bíblia, Deus, meio dia em ponto... e ia longe.