quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Professora Dona Ana Letícia

Foi minha professora de Língua Portuguesa na 7ª série da Escola Municipal Coronel Romão Gomes.
Era uma senhora loira, alta, de olhos claros, bonita, rigorosa e muito exigente. Era advogada, assim como a maioria dos professores de Língua Portuguesa de minha época. Costumo dizer que para ser um bom advogado não basta decorar leis, artigos, incisos e toda a linguagem jurídica, o importante mesmo é conhecer o português (não o português da padaria, mas a nossa língua nacional). 
Dona Ana Letícia participou do nosso amigo secreto ou amigo oculto e eu tirei seu nome do grupo de papeizinhos dobrados com os nomes dos participantes da brincadeira de fim de ano.
Fiquei preocupada com o que compraria para ela, pois na minha época de ginásio, hoje ensino fundamental II, os professores eram respeitados, admirados e até temidos. 
Mas antes da data de entrega dos presentes e da revelação dos amigos ocultos, todos nós trocávamos bilhetinhos com a clara intenção de confundir nosso amigo. Para despistar a professora eu fingi ser menino e escolhi o apelido de Bentinho, da obra Dom Casmurro de Machado de Assis.
Dona Ana Letícia acreditou mesmo que era o menino Bentinho e adorou o fato de eu ter lido o livro de Machado de Assis. Até hoje gosto da cena "O Penteado" em que Bentinho penteia os cabelos de Capitu, que por sua vez tinha os olhos de cigana oblíqua. Cigana eu sabia o que era, mas me intrigava os olhos e oblíquos. Por quê? O que Machado de Assis quisera dizer com aquilo?
Bom, ia dizer também que sou da época que chamávamos os professores de "Dona" e "Seu".
Era Dona Ana Letícia, Seu Adelino e por aí vai.
Conclui a 8ª série e tive de mudar de escola para concluir o colegial. 
Mas ao chegar à nova escola estranhei a forma moderna com que os alunos tratavam os professores; os chamavam de você e pelo nome, sem o "Seu" ou o "Dona" na frente do nome do professor. 
Ouvia meus colegas conversarem e dizerem, por exemplo: "Hoje tem aula da Vera Lúcia, de Português....A segunda aula será do Mariano de matemática...".
Mas voltando à 7ª série....
Recebi muitos bilhetinhos de Dona Ana Letícia e os tenho até hoje! Me marcaram muito e quando estou triste, os releio e vejo que a professora já via em mim uma pessoa bacana. 
Leio e penso comigo mesma: "Eu sou uma pessoa legal, tenho bom coração, não sou esse monstro que as pessoas pensam que sou só por causa de minha aparência, para uns, ou por causa de uma infantilidade crônica e desmedida de outros. 
Bom...
Acho que Dona Ana Letícia já deve estar no céu. Ela já era uma senhora quando eu tinha 13 anos e estava na 7ª série. 
E outro professor que também já deve estar no céu é o professor Oswaldo, também de Língua Portuguesa. Tínhamos duas aulas consecutivas com ele - dobradinha - e ele sempre trazia textos para ler para nós. Até hoje lembro e gosto muito do "Pombo Enigmático" de Paulo Mendes Campos, que deixou a noiva esperando agoniada e a explicação que ele deu-lhe ao chegar ao encontro foi que estava uma tarde tão linda que ele resolveu ir caminhando em vez de voar! Lindo!
Bons tempos aqueles de professores queridos, às vezes temidos e principalmente: RESPEITADOS.
Bons tempos aqueles de escolas abertas, sem grades horrendas, sem parecer uma prisão. O belo bosque onde adorava passear nas aulas vagas hoje está cercado de horrendas grades metálicas.
O que fizemos com a Educação?!
Por que não poderia haver professores como a Professora Dona Ana Letícia e o Professor Seu Oswaldo?!
Por que não poderia haver alunos como eu e meus colegas da 7ª série?
Vou reler novamente de novo os bilhetinhos da Dona Ana Letícia para matar a saudade.



           

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