terça-feira, 1 de maio de 2012

Rádio

                                         


Ouvíamos muito rádio. 
Somos da época da TV preto e branco e com poucos canais; não tinha redes sociais, TV a cabo, Internet, telefones celulares e toda essa parafernália digital e cibernética que temos hoje.
Papai ouvia o futebol pelo rádio de pilha e era estranho ouvir o locutor narrar tão rapidamente o jogo. 
Aliás, pilha (para nós era elemento) era item obrigatório na nossa lista de compras.
Mãevelha ligava o rádio de madrugada e sempre sintonizava no programa do Zé Betio. Era divertido ouvir o programa com música sertaneja da boa, e não isso que temos hoje em dia: rapazes com calças mais justas do que Deus, outros com cabelos arrepiados, outros esganiçados e que acham que cantar é gritar e os denominados sertanejo universitário. 
Zé Betio fazia um programa barulhento e engraçado e eu achava que aqueles sons todos eram reais. Tinha sons de animais de fazenda, de um garotinho falando com o locutor, de uma mulher tentando acordar o marido preguiçoso e muitos outros.
Zé Betio falava as horas e dizia que era hora de levantar, hora de ir para o trabalho e ainda aconselhava as suas ouvintes donas de casa: "Joga água nele, dona Maria".
Tocava uma música assim: "Quem é que não chora por alguém?" e ele respondia: "É o Zé Betio"... "Quem é que não chora uma lágrima sentida?"... "É o Zé Betio".
E o programa prosseguia com o locutor falando as horas, tocando música sertaneja da boa e conversando com personagens engraçadas que me faziam viajar na imaginação. Era galo cantando, balido de bodes, um garotinho perguntando as horas e dizendo: "Tá na hora da janta", a mulher tentando convencer o marido preguiçoso a se levantar: "Acorda homi, tem que trabaiá pra comprá as coisa". 
Era muito legal.
Lembro um dia que Zé Betio não foi à Radio para fazer seu programa e ficamos sabendo que seu irmão Arlindo Betio fora sequestrado e assassinado.
Foi um assunto que chocou a todos os ouvintes do radialista.
Depois do programa do Zé Bétio entrava Eli Correa, aquele do "Oiiiiiiiiiiii gente!" e falava a hora em cima da música. Era impossível ouvir a música inteira.
Acabava Eli Correa e entrava Altieres Barbiero com o programa "A Volta do Sucesso". Eu achava Altieres Barbiero mais elegante que o barulhento Zé Betio e o emocionalmente exagerado Eli Correa.
Depois era a vez de Barros de Alencar que tinha no seu programa o ajudante Fubá, que acabou emprestando o apelido ao nosso irmão caçula, e tinha a sessão fofoca onde o fofoqueiro profissional Nelson Rubens dava as últimas notícias sobre os famosos da época.
Meu, na boa, acho que o Nelson Rubens deve estar com uns cem anos! Eu era criança e o cara já fofocava na rádio!
Barros de Alencar também cantava e gravou umas músicas bem bregas sobre dor de corno mesmo! Era muita cornice romântica!
As músicas que mais tocavam nessas rádios eram músicas do Amado Batista, Paulo Sérgio, Sérgio Reis, MPB e música sertaneja de raiz: Tonico e Tinoco, Cascatinha e Inhana, Milionário e José Rico e por aí vai.
Mamãe e a Cleusa achavam Milionário e José Rico muito lindos!(só Jesus).
Lembro da cantora Tetê Espíndola que vencera o "Festival dos Festivais" da Rede Globo em 1985 com a canção "Escrito nas estrelas"; mas quando tocada na rádio, a música era "cortada" durante o trecho que dizia " meu tesão". 
A palavra era considerada ofensiva na época.
E hoje somos obrigados a ouvir cada coisa...
Bom...
Havia um radialista, o Paulo Barbosa, que vinha logo depois do Altieres Barbiero. Eu não gostava muito dele porque ele sempre começava o programa assim: "Bom dia, vó gostosa, vô gostoso..." Todo mundo era gostoso para ele. Eu hein!
Eram programas da Rádio AM, a FM ainda não estava tão em voga.
Papai comprou um rádio moderno que funcionava tanto com pilha como com eletricidade e tinha as opções de AM e FM. 
Mas papai não gostava que ouvíssemos FM porque segundo ele, gastava mais pilha e estragava o rádio! Não sei de onde ele tirou isso, mas era mais uma de suas muitas "inguinóranças".
Nós aproveitávamos quando ele ia trabalhar e ligávamos o rádio na FM e ouvíamos nossas rádios favoritas: Rádio Cidade e Transamérica. Quando se aproximava a hora de papai voltar para casa, mudávamos o rádio para AM e o guardávamos direitinho, papai nem desconfiava, até que um bendito dia nós esquecemos de mudar para AM e ele liga o rádio e...Vixe! Tome sermão.
O rádio marcou nossas vidas e marcou uma época que só tocava música boa, mesmo as bregas de dor de corno, bem diferente do que temos hoje: sertanojo universitário, funk fazendo apologia às drogas e tratando a mulher como mero objeto sexual, cantorezinhos de uma música só, filhos e filhas de duplas sertanejas que pensam que cantam, e por aí vai.
Mas temos rádios boas: Nova FM que só toca música brasileira, Alpha FM que toca velharias que nos fazem perceber que estamos ficando velhos e a Kiss FM, que toca o bom e velho Rock n´Roll.
É isso.

                                          
                                      

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