sábado, 7 de abril de 2012

Carta de amor

                                       


Havíamos nos mudado para a pequena casa de quintal grande. Era na mesma rua da casa da majestosa mangueira onde chorei ao me despedir de mamãe que fora ao hospital buscar minha irmã Rosi.
Era final de ano eu havia concluído a quarta série e mamãe já havia feito a matrícula para a quinta série. Mesmo com todos os problemas, mesmo com minha infância e adolescência roubadas e transformadas em obrigações, responsabilidades e vida de gente grande eu conseguia tirar boas notas na escola.
Eu não era gênio, mas conseguia me sair bem.
Foi nessa casa em que mamãe eu lavávamos as roupas dos caminhoneiros gaúchos e que meus irmãos ficavam sós na companhia do cachorro Bobbie até mamãe voltar do trabalho.
Vivemos fortes emoções nessa pequena casa de quintal grande.
Foi nessa casa que conhecemos novos vizinhos e meus irmãos arteiros fizeram novas amizades com meninos mais arteiros ainda. Ave Maria.
Foi nessa casa que recebi minha primeira carta de amor. Muito romântico mesmo.
Nossa casa era bem simples e admirávamos as belas casas do bairro e da nossa vizinhança.
Numa bela casa com garagem, azulejo, piso e tudo de bonito que uma casa de "rico" deveria ter, morava uma família de quatros pessoas: os pais e dois irmãos, todos galegos branquelos de olhos azuis. 
Um dos irmãos era um menino gorducho, com cabelos loiríssimos, olhos muitos azuis e bochecha rosadas. Parecia que tinha passado blush e a molecada da rua dizia que ele tinha duas mortadelas na bochecha. O irmão mais velho já estava na faculdade e era um rapaz alto, magro e elegante.
O gorducho chamava-se Sérgio e a mãe o cobria de mimos, daí seu corpinho vitaminado. Alguns pais acham que amor materno/paterno só pode ser demonstrado com excesso de comida, brinquedos, mimos, manhas e falta de limites.
Bom...
Eu estava com onze anos e estava na quinta série e Sérgio era dois anos mais velho que eu e estudava em escola particular.
Um dia a filha da vizinha me chama pelo muro e me entrega uma folha de caderno toda dobradinha e disse: "Mandaram entregar pra você". Eu não entendi muita coisa a princípio e perguntei meio impaciente: "Tá. Mas quem?"
Ela não disse.
Entrei em casa, desdobrei a folha do caderno e vi que era uma carta de amor toda escrita com letra bonita e cuidadosa. E era do Sérgio, o vizinho gorducho.
Fiquei encantada e orgulhosa, pois um menino estava apaixonado por mim!
Mas Sérgio não era bem o meu tipo favorito de "homem".
Mas gostei muito da carta de amor e a lia e relia inúmeras vezes durante o dia e a escondera debaixo do meu colchão. 
Não sei como, mas papai descobriu a tal carta, a rasgou em pedacinhos e infernizou minha vida durante o dia inteiro. Jesus!
Papai dizia que ia falar com os pais do menino, que ele não tinha filha de onze anos pra namorar galalau taludo e sem vergonha...E a ladainha prosseguia.
Mamãe tentava amenizar e dizia que era normal, que não tinha nada demais e que eu e o menino éramos apenas crianças. 
Custou a mamãe convencer papai a não perturbar os pais do meu Romeu apaixonado.
Sei que tempos depois nos mudamos novamente e eu nunca mais vi ou soube do menino gorducho apaixonado com cara de mortadela.


                                       





Nenhum comentário:

Postar um comentário

Deixem comentários, adoro saber o que pensam sobre o blog. Obrigada ;-)