quarta-feira, 14 de março de 2012

Lápis de cor

                                           


Estava matriculada na primeira série.
Eu estava muito feliz, as aulas começariam em algumas semanas.
No primeiro dia de aula trago a lista de material escolar e um aviso para comparecer às aulas vestida com uniforme: saia azul marinho, meias brancas, camisa branca e sapatos ou tênis pretos ou azuis.
Nossa vizinha judia tinha todos os filhos na escola e nos deu uniformes que não serviam mais em suas crianças.
Usamos muitas roupas doadas por patroas e vizinhas de mamãe.
Minha avó Mãevelha lavou, passou e consertou algumas das peças de roupa que ganhamos; tudo parecia novo.
A ajuda da vizinha judia veio em boa hora, pois mamãe não tinha meios de comprar um uniforme novo e não tínhamos a moleza que os alunos têm hoje: uniforme e material escolar de graça.
Vou para a escola vestida no uniforme azul e branco. Levo o caderno, o lápis e a borracha dentro de um pacote de arroz de cinco quilos.  A embalagem do arroz era plástica e protegia meu material caso chovesse.
Meu irmão Rogério brincava dizendo que só colocaria o material dele se o saco fosse de arroz Camil.
O saco de arroz era grande o suficiente para caber minhas coisas, eu ainda não tinha todo o material escolar requisitado.
Chega o tão esperado dia do pagamento e vou com papai ao supermercado para comprar meu material escolar. Vou alegre e saltitante pelo caminho afora.
Papai comprou metade do que pedia a lista. Fiquei muito triste.
Uma caixa com doze lápis de cor. Lápis longos, coloridos, bonitos.
Mas papai acha caro e pede uma pequena caixa com seis pequenos lápis de cor.
Eu insisto: "Mas pai, não dá para comprar a caixa grande com doze lápis?"
"Dá não. Para o mês talvez dê para comprar, hoje não".
Esperei muitos "para o mês" e a caixa com doze longos e bonitos lápis de cor nunca fora comprada. Até hoje detesto e desconfio quando alguém promete algo e diz: "Um dia, uma hora, talvez, quem sabe..." Não gosto disso, tem que ter hora, local e razão e ser assumido e cumprido. Pronto.
Nossa prima vai nos visitar e me traz um saco plástico com inúmeros lápis de cor das mais variadas cores; cores que não tinha na minha pequena caixa de seis.
Vou para a escola feliz e mostro meus muitos e coloridos lápis para uma colega esnobe que sempre se negava a emprestar seus lápis para mim, quando eu pedia emprestado ela dizia: "Não posso. Minha mãe não deixa".
"Mas sua mãe não está aqui para ver".
"Não posso!"
A coleguinha egoísta não emprestava nada a ninguém.
Bate o sinal da entrada e fazemos fila para irmos à nossa sala de aula. Entramos e nos sentamos em nossos lugares. Coloco em cima da minha carteira o saco plástico cheio de lápis das mais variadas cores. Os coleguinhas se aproximam, olham, encantam-se com aquela profusão de cores e me pedem: "Posso pegar emprestado?"
"Pode".
A coleguinha egoísta se aproxima e pede também: ""Você me empresta?"
"Não. Minha mãe não deixa".


                                                 

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