quarta-feira, 21 de março de 2012

Caminho

                                                  


Gosto de caminhos.
Caminhos de terra, de chão batido.
Caminhos com o capim dourado e queimado pelo sol e pelo pisar dos pés e das caminhadas.
Celebro quando encontro um caminho de terra perdido em meio a tanto cimento e asfalto na nossa Pauliceia desvairada.
Aguardava passagem em um cruzamento complicado e até gostei da demora, assim pude entregar-me às memórias, lembranças e saudades que os caminhos me trazem. Havia um caminho de terra beirando o asfalto da rua e o cimento da construção.
...
Uma amiga minha, a Cleusa, me perguntou se me lembro mesmo de tudo o que escrevo e a resposta foi e é: Sim.
Foi tudo tão curto, tão rápido e tão intenso mas que deixaram as marcas que hoje são os meus pilares de sustentação.
Minha curta e intensa infância no sertão nordestino do meu amado Pernambuco.
Minha infância e adolescência de trabalho, grandes responsabilidades e grandes cobranças aqui em meu querido São Paulo.
Os mimos, manhas e lundus dados a mim e feitos por mim com o apoio, a conivência e o amor do meu avô Paipreto e do meu avô José.
As broncas de mamãe e de Mãevelha.
Foi tudo tão bonito; mesmo sofrido, mesmo dolorido, mesmo esperançoso, mesmo triste algumas vezes, mas sempre bonito.
Os caminhos por onde andava segurando a mão de mamãe entre os pés de feijão.
Os caminhos pelas ruas de Gravatá com uma mão no bolso da minha adorada jardineira e a outra segurando a mão do meu Paipreto.
Os caminhos até a bodega do meu avô José para me deliciar e me lambuzar com bolo de araruta e tubaína.
Os caminhos pelo milharal e pela mata em busca de coquinho catolé com meu Paipreto.
Os caminhos até a casa de tia Antônia para me deliciar com o lambedor feito por tia Anália.
Os caminhos até a casa de tia Nifa e bisavó Gina para me deliciar com a salgada farofa de farinha e ovo.
Os caminhos que meu bisavô Francisco percorreu quando deixou esse lado da vida. Eu o vi caminhar, parar no meio do caminho, tirar o chapéu, me olhar, se despedir de mim e voltar ao caminho. Eu sentada à mesa saboreando minha farofa salgada via Mãevelha e bisavó Gina no quarto sentadas ao lado do corpo do meu bisavô Francisco; bisavó segurava uma vela acesa nas mãos dele e rezava pedindo a Deus e ao Povo lá de cima que recebessem meu educado, elegante, doce e gentil bisavô. Eu olhava aquela cena e olhava para fora e via meu bisavô se afastar pelo caminho; como ele podia estar deitado na cama e andando lá fora ao mesmo tempo? E por que Mãevelha e bisavó choram? Por que mamãe chora? Daqui a pouco bisavô volta. Oxe!
...
Os caminhos pelas ruas do bairro das chácaras e hoje dos caminhões.
Os caminhos ao encontro de mamãe.
Os caminhos de volta da escola para ficar em casa com meus irmãos.
Os caminhos até os hospitais.
Os caminhos para sair do coma e voltar para esse lado da vida.
Os caminhos até aqui.
Você não sabe o quanto eu caminhei...


                                                 









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