sábado, 26 de novembro de 2011

Português & Espanhol

                                        


Papai trabalhava vendendo doces, salgados e café numa barraquinha instalada na calçada de um posto de saúde.
Papai levantava muito cedo, preparava o café e saia com sua sacola pesada para tomar o ônibus.
Algumas vezes papai reclamava do motorista do ônibus que não parava ao sinal de papai, mas parava fora do ponto para ser gentil com as moçoilas de cofrinhos à mostra.
Papai era ignorante, semianalfabeto, teimoso, manhoso, tinhoso, mas muito trabalhador. Até demais. Pena que alguns dos filhos dele não puxou a essa tão nobre característica.
Papai estava se cansando; anos e anos de trabalho duro e o que deveria ser apenas uma atividade para passar o tempo acabou se transformando em trabalho sério para o sustento da casa e de pessoas sem noção.
Papai sabia assinar o nome e escrever algumas palavras muito rusticamente, aliás, foi mamãe que ensinou-lhe as primeiras letras. Papai também falava rápido demais e às vezes até nós mesmos tínhamos dificuldade para entender o que ele dizia. Uma colega de minha irmã Rosi perguntou a ela como entendíamos o que nosso pai dizia e ouviu a resposta:
"É que nós já nascemos com a tecla SAP".
Papai está em sua barraquinha arrumando suas coisas quando uma boliviana se aproxima. Há um número muito grande de hermanos bolivianos em São Paulo.
A boliviana pergunta a papai se tem pastel. Para nós pastel é aquela massa recheada e frita que comemos na feira com caldo de cana. Delícia.
Papai não entende e olha para mim pedindo ajuda. Eu finjo que não entendi também.
A moça continua a pedir pastel e a gesticular, numa tentativa de se fazer entendida e conseguir o que tanto deseja: bolo. É, pastel em espanhol é bolo.
Papai fica nervoso e coloca em cima do balcão vários tipos de bolacha enquanto fala para a moça de língua hispana: "Ói, tem essas bulacha aqui ó. Tem réchiada, doce, saigada e cremi cráqui". 
Mas a boliviana balança negativamente a cabeça e dizia: "No senõr, aquele pastel, así redondo".
Ahhhhhh bom! Agora sim. Ela queria bolo.
"Pai, ela quer bolo".
"Oxe, e pruquê ela num falô antes?"


                                      

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